domingo, 10 de março de 2013

Revisitar

Santiago de Compostela - 2011


Um dos dilemas que se coloca a quem gosta de viajar é o voltar ou não aos lugares por onde já se passou. Se por um lado a oportunidade de conhecer outros lugares é escassa (quer em tempo quer em dinheiro, sendo importante não disperdiçar oportunidades), por outro não se conhece verdadeiramente um lugar se não nos sentirmos lá como em casa. Para além disso, voltar a um lugar tem outra vantagem. Passado o fascinio da novidade começamos a ver os pormenores, o que realmente é esse lugar. Mais, assiste-se à evolução desse mesmo lugar (para melhor, para pior ou para diferente), o que é sempre uma experiência interessante.

Poucos são os lugares onde volto ou voltaria com prazer. Menos aqueles em que tive a oportunidade de o fazer. Santiago de Compostela está, em qualquer dos casos, no topo da lista.

Apesar de ter tido alguns anos de interregno nas minhas regulares visitas à cidade, a quantidade de vezes que já lá fiquei faz-me sempre sentir em casa quando aí regresso.

Da primeira vez, ao fim de dois dias já conhecia boa parte do “casco” velho da cidade. Ao fim de alguns anos aprendi a comer como os locais e a tirar partido das raciones. No entanto foram precisos mais uns anos para conhecer pessoas que, mesmo após uma ausência mais prolongada, nos fazem uma festa sempre que nos revêem.

A fotografia que publico é uma fotografia “clichet” da catedral, tirada do Parque da Alameda. Mas o que é que mais se pode fotografar ao fim de tantos anos de por aqui passar?
A primeira vez que fomos a Santiago de Compostela (ainda e gloriosamente no Fiat 600) foi, se a memória não me falha, em 1982. Partimos de Viana do Castelo, de manhã, num dia de muito calor. Chegámos ao fim da tarde a Santiago (após várias paragens para deixar arrefecer o carro e voltar a pôr água no radiador). Na altura ainda se podia estacionar frente à catedral, sem qualquer restrição.
A última vez (até à data) foi no ano passado. Chegámos a meio da tarde, vindos de Léon. Desta vez o carro teve que ficar num dos vários parques de estacionamento espalhados pela cidade.

Como referi, muitas das minhas férias passaram por Santiago, razão pela qual guardo muitas e boas recordações (mesmo quando chove, o que não é raro). Mas essa memória fica para outra ocasião. Apenas como curiosidade gostava de referir que foi também em Santiago que a minha filha, então com três anos, acampou pela primeira vez, rendendo-se (julgo eu) ao campismo e, claro, à cidade.

domingo, 3 de março de 2013

O Comboio

Kyle of  Lochalsh, Escócia - 1985

Desde miudo que “comboio” é sinónimo de viajar.
Embora andasse prioritariamente de camioneta, para destinos mais longínquos como Lisboa ou Coimbra ia sempre de comboio.
Este foi sempre o meu meio de transporte preferido. Não porque fosse propriamente mais confortável (com excepção do pequeno trajecto entre Alfarelos e Coimbra B feitos no “rápido” de Lisboa), mas porque era o mais aventuroso. Podiamos andar em pé, balançando ao som das rodas nos carris, tinha casa de banho (o que era sempre bom e onde se podia ver a linha passar por baixo da sanita, visão por vezes assustadora) e, à noite, no regresso de Coimbra, dormia atravessado no banco, embalado pelo movimento da carruagem.
Sobre a camioneta o comboio tinha ainda, para mim, outra vantagem: eu não enjoava.
Dessas viagens tenho ainda mais duas recordações: o facto de o meu pai saber sempre a sequência das estações e apeadeiros por onde passávamos (ou então enganava muito bem) e a eterna pergunta, quando a viagem já ia longa e cansativa: “ainda falta muito ?”.
Acima de tudo, desta época, ficou o prazer de andar de comboio, bem como o sonho e o desejo de fazer grandes viagens.

Sorte do destino quis que a minha companheira de aventuras partilhasse o mesmo desejo e paixão por comboios. De tal forma que, para poder apreciar o prazer da viagem de comboio, chegámos a “embarcar” de véspera o carro para o Porto e fazer a viagem no “foguete”, no dia seguinte. É certo que o carro em questão era um Fiat 600, com quase vinte anos, e de outra forma, a viagem demoraria uma eternidade. Mas o que nos agradava nesse pequeno luxo era, sobretudo, a viagem de comboio.

O comboio tem um problema. Pode ser a última maravilha da técnica ou... a última maravilha de há muitos anos (e por vezes sabe-se lá em que estado de conservação). No entanto, a meu ver, as vantagens superam em muito os inconvenientes. Para além da descontração da viagem, as linhas de comboio passam quase sempre por fora dos centros urbanos e das povoações, dando-nos uma visão diferente dos lugares e das paisagens. Mesmo quando entram nas cidades a visão que nos mostram é única e diferente. Guardo na memória, entre outras imagens, a vista deslumbrante do Porto, de cima da ponte Dª Maria e, por oposto, os bairros degradados dos arredores de Paris.

A minha grande traição ao comboio ocorreu na minha primeira viagem de longa distância. Bem mais económico, foi num autocarro que cheguei pela primeira vez a Paris, após dois infindáveis dias sentado num banco.
Nesse mesmo ano foi ainda um autocarro que me levou a Londres. No entanto foi o comboio que me permitiu um primeiro vislumbre da Grã-Bretanha e em especial da Escócia.

Numa época em que se investe cada vez mais em estadas, é ainda graças ao comboio que se podem admirar paisagens fascinantes ou chegar a locais longínquos como o da imagem.