quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Entrevista com o Pai Natal

Posto dos Correios, Aldeia do Pai Natal, Lapónia - 2013
Tenho uma triste noticia para dar às crianças de todo o mundo: andam a ser enganadas pelo vosso pai. Quando ele vos diz que o Pai Natal não existe, está a enganar-vos.

O PAI NATAL EXISTE !!! Eu sei. Eu já estive com ele. Aliás, eu tenho uma fotografia com ele que o pode comprovar.

Vou-vos contar tudo.
Num passado mês de Agosto (porque será sempre em Agosto?) fomos até à Lapónia, junto ao Circulo Polar Ártico.
Nessa nossa aventura ficámos em Rovaniemi, cidade próxima da Aldeia do Pai Natal.

Apesar da educação que recebemos ("o Pai Natal não existe"), fomos até lá pela curiosidade. Para ver como é que eles mostravam o Natal e, sobretudo, o Pai Natal.

Na ausência de neve (estávamos em Agosto, lembram-se) os edifícios da aldeia não se destacavam muito da paisagem. Todas as construções são, basicamente, feitas de madeira e pedra.
Umas lojas de "souvenirs", uns restaurantes, umas renas e, claro, o posto dos correios compõem o lugar.

Estávamos nós num dos edifícios quando um jovem vestido de elfo (que, bem vistas as coisas, não sei se não seria mesmo um elfo) apontou para uma porta discreta e perguntou-nos se não queríamos falar com o Pai Natal. "Não precisam de pagar nada", disse ele.
Como já tínhamos visto mais ou menos toda a aldeia e ainda faltava muito para o autocarro nos devolver ao hotel, decidimos aceitar o desafio.

Atravessámos a porta e, à nossa frente o corredor transformou-se numa espécie de mina ou galeria. Nas paredes estavam vários desenhos técnicos descrevendo como o Pai Natal conseguia percorrer todo o mundo a entregar os presentes aos meninos, sempre à meia-noite. Basicamente consistia em abrandar a rotação da terra, agindo sobre o seu eixo.
De repente (zás!) estávamos nós perante o eixo da terra e os mecanismos utilizados pelo "senhor de barbas" para manipular a rotação da terra e proceder às entregas.

Uma grande escadaria de madeira levou-nos ao andar de cima onde ficava uma antecâmara, uma sala de espera. Nessa sala existiam junto à parede uns bancos corridos, onde nos sentámos, a aguardar a nossa vez para o prometido encontro. À nossa frente um rapazinho com os seus pais aguardava, também ele, a sua vez.

Um elfo veio buscar a família que nos precedia e encaminhou-os para a sala seguinte.
Enquanto aguardávamos a nossa vez fomos vendo as paredes repletas de fotografias de outras pessoas ou grupos que já lá tinham estado, sempre acompanhados pelo Pai Natal.

Chegada a nossa vez, o elfo perguntou de onde vínhamos, fazendo-nos passar à sala seguinte.
Esta nova sala tinha um aspecto acolhedor, destacando-se uma espécie de sofá largo, de onde o Pai Natal saiu para nos vir receber.
Como um bom anfitrião pediu-nos para nos sentarmos, perguntou pela nossa viagem e esteve ali um bocado à conversa connosco.

Juro-vos. Aquele momento foi mágico e o Pai Natal revelou-se uma pessoa maravilhosa.

Depois de uma experiência como esta não é possível dizer a alguém que o Pai Natal não existe.

Já quanto ao Coelhinho da Páscoa ...

domingo, 14 de dezembro de 2014

O cortejo das pedras

Carnac, Bretanha - 2002
Chegámos ainda de manhã.
O dia estava cinzento e chuvoso. Não uma chuva intensa mas uma poalha desagradável que se entranhava na roupa, causando desconforto. 

Estacionamos o carro junto da povoação e andamos algumas dezenas de metros até termos a primeira visão, o primeiro contacto.
À nossa frente, numa larga faixa de terreno, erguiam-se centenas de pedras, todas elas alinhadas em várias filas.

Nessas férias a estrada levou-nos até à Bretanha.
Estabelecida a nossa base em Rennes, durante perto de uma semana, fomos deambulando e descobrindo aquela região de França.

Apesar de ter alguma curiosidade, visitar Carnac não era uma das minhas prioridades. No entanto, estando ali tão perto, não podiamos deixar de lá ir.

Frente a tão invulgar paisagem tinha que concordar com o destaque que lhe é dado.
O conjunto que agora contemplava era algo de estranho (embora o clima também ajudasse a dar algum ambiente). Frente a tão singular paisagem não podemos deixar de fazer aquelas perguntas que dezenas de arqueólogos também já fizeram: para quê estes alinhamentos? Porquê este lugar?

Verdade seja dita, nem as pedras nem ninguém me responderam às questões. Mas valeu a pena lá ter ido.


Informação adicional em:

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Natal em Agosto (II)

Loja em Heidelberg, Alemanha - 2007
Seja pelos tempos que se avizinham, seja por qualquer outra razão, o facto é que ultimamamente apenas me têm vindo à memória situações em que, quando menos espero, me cruzo com o Natal.
Curiosamente (ou talvez não) ocorreram sempre no Verão.

Este meu encontro aconteceu durante a nossa passagem por Heidelberg.
Convém talvez referir que, nos poucos dias que por lá andámos, o clima esteve sempre muito incerto. E apesar de termos apanhado algum sol, choveu em boa parte do tempo. Quanto a temperaturas, andaram sempre mais para o fresco do que para o quente.

Ora, num dos finais de tarde, após termos dado um longo passeio pela cidade velha, o tempo (re)começou a ficar mais invernoso. À medida que o sol foi baixando, a temperatura foi também ela descendo e,.por fim, começou a cair uma chuvinha miúda muito desagradável.

Uma vez que ainda faltava algum tempo para pensarmos em jantar, para fugir à chuva decidimos entrar no que me pareceu ser uma pequena loja de artesanato.
Lá dentro verificamos que a loja se prolongava, vislumbrando-se a existência de mais salas. Como tempo era algo que não nos faltava, fomos entrando e vendo o que por ali havia.
Bonecos "quebra nozes", com as mais diversas indumentárias, brinquedos de madeira de vários tipos, candelabros para velas, feitos de madeira recortada, e muitos outros objectos, maioritariamente natalícios, foram fazendo as nossas delícias.

À medida que a nossa atenção ia saltando de uma peça para outra, fomos avançando para o interior da loja, aproximando-nos da sala central. E foi aí que o encontro se deu. Quando entrámos a visão foi magnifica. No centro uma enorme e brilhante árvore de Natal dominava a sala.
Nesse momento esqueci-me do mês em que estávamos e, naquela sala, com aquela árvore, rodeado de brinquedos, senti-me no Natal.

O lugar era tão agradável que, confesso, foi com alguma pena e custo que nos afastámos da árvore e saímos da loja. Já cá fora na rua, o tempo fresco e chuvoso foi prolongando um pouco mais o clima natalício (pelo menos para os nossos padrões) gerado por aqueles momentos, dentro daquela loja.

Apesar de não nos termos apercebido do tempo gasto lá dentro, a fome fez-nos voltar à realidade. De facto, não há nada como um bom jantar, numa pequena cervejaria (alemã, claro) para nos afastar das nostalgias de Inverno e nos "trazer de volta" ao mês de Agosto e às férias de Verão.


Informação adicional em:

domingo, 23 de novembro de 2014

Natal em Agosto

Armazéns Harrods, Londres - 2006
Diz a tradição que o "Natal é quando um homem quiser".

Estávamos nós no inicio de Agosto de 2006 quando, para grande espanto e noticia nos media, os armazéns Harrods, em Londres, anunciaram a abertura da secção de Natal.
Numa época do ano em que boa parte das pessoas só pensa em calor e sol, falar no Natal parece ser um contracenso. Mas pelos vistos não é.

Calhou estarmos em Londres, quando este anuncio se deu. Obviamente não poderíamos deixar passar a oportunidade de entrar em tão controverso lugar.
Foi assim que, numa bela tarde de Agosto, lá fomos nós visitar a propagada secção.

O espaço, composto por várias salas, era todo ele interior, permitindo-nos esquecer, por instantes, o sol e os vinte e muitos graus que estavam na rua.

Passado o primeiro impacto e à medida que fomos entrando nas salas, fomos sendo envolvidos pelas decorações que nos lembravam a neve e os agasalhos do inverno, pelas luzes coloridas e pelos materiais cintilantes, fazendo-nos entrar  no espírito natalício e transportando-nos para outra época do ano.
Tudo isto sem estranhar que, naquele ambiente, as pessoas estivessem com roupas frescas, tais como calções ou  camisolas de manga curta.
Esta nova realidade anacrónica, acabou por gerar e envolver-nos numa certa atmosfera "mágica".

Terminada a visita (tendo eu resistido, por vezes com alguma dificuldade, a comprar enfeites natalícios), regressamos de novo à rua e à realidade de Agosto.
No entanto, esta meia hora deixou-me o estranho sentimento de ter vivido numa realidade paralela, onde o calor e o Natal se misturaram.

Não esquecendo que tudo isto foi uma bem montada manobra de marketing, não é pois de admirar que, muitos dos visitantes desta nova secção, tenham saído cheios de embrulhos.

Infelizmente esta experiência faz-me pensar que, ao contrário do dito popular, nos tempos que correm "Natal é quando o marketing quer".


Nota: actualmente a abertura da secção de natal do Harrods realiza-se em Julho.


Informação adicional em:
A parada de Natal, no Daily Mail
A noticia da 'chegada' do Natal, no Guardian

domingo, 9 de novembro de 2014

O caos da Ribeira

Mercado da Ribeira, Lisboa . 2014
Como vamos tendo cada vez menos horas disponíveis, os lugares com prateleiras cheias de produtos apelativamente embalados, disponíveis quase 24 horas por dia e onde não temos necessidade de falar com ninguém (excepto, talvez, para perguntar onde está um determinado produto), vão-nos seduzindo e ocupando o nosso quotidiano..
É assim que os mini, super e sobretudo hiperrmercados vão entrando no nosso dia-a-dia, matando e tomando o lugar dos simplesmente (e antigos) mercados de bairro.
Aos poucos, estes vão perdendo dimensão, ficando entregues apenas aos seus mais antigos e fiéis clientes. E há medida que os seus "velhos" clientes vão desaparecendo, os mercados vão sucumbindo com eles.

Do que me recordo da  minha última passagem pelo Mercado da Ribeira, é que o espaço estava um pouco degradado, mas que ia cumprindo o seu papel.
Tal como tantos outros mercados tradicionais, convenci-me que a Ribeira não iria ser uma excepção, tendo também ela como destino uma lenta e agonizante extinção. No entanto, uma noticia de jornal fez-me criar alguma expectativa contrária.
Após obras de conservação, parte do mercado foi transformado num espaço de restauração (para além, claro, do já famosos cacau).

E foi assim que, num dos sábados seguintes, decidimos ir lá almoçar.

Quem teve a ideia e operou a transformação do espaço (sinceramente desconheço o processo), fez, no geral e em minha opinião, um bom trabalho.
Manteve numa das naves do edifício a sua função original de mercado, enquanto que a outra foi transformada num espaço dedicado à restauração e ao lazer.

Do lado da restauração, as antigas lojas do mercado, que rodeiam toda a nave, foram concessionadas a restaurantes. A diversidade destes pequenos espaços permite uma variedade e amplitude de escolha de pratos, que vão desde o puramente vegetariano ao ostensivamente carnívoro.

No meio do pavilhão (barulhento, como compete a um mercado) foram colocadas umas mesas corridas, de madeira clara, onde nos podemos sentar, partilhando, de mdo informal, a refeição, com todos os outros clientes deste espaço.

Fosse por ser fim de semana, fosse por estar na "berra", o espaço estava cheio, o que nos obrigou a deambular algum tempo pelas mesas à procura de dois lugares frente a frente para nos sentarmos.

Quando finalmente me vi sentado, frente a um belíssimo hamburguer de salmão, olhei à volta para apreciar o lugar e pensar sobre ele.

O espaço, "vintage" QB, é agradável. A oferta de opções de refeição muito variada. Os clientes muito heterogéneos, havendo-os de todas as idades e nacionalidades. Enfim, tem tudo para ser uma aposta ganhadora.
No entanto, apesar de todos estes pontos positivos, porque é que fiquei sem grande vontade de voltar? A resposta é simples e lamento ter de a dar: os clientes eram maioritariamente portugueses.

Não que eu tenha algo contra essa nacionalidade, até porque eu sou um deles. O que me desagrada é o velho e enraizado (mau) hábito de reservar um lugar, horas a fio se necessário, para só depois, calmamente, ir procurar escolher o que comer.
De facto, ao olhar para o espaço das mesas, estas estavam cheias. Mas sobretudo de pessoas à espera e a reservar vários lugares nelas. Em volta, quase outros tantos, andavam a passear os tabuleiros na esperança de encontrar um lugar desocupado, tal como já me acontecera a mim.

E é esta procura, stressante, com a noção de que o almoço está a arrefecer, este pedir quase por favor para me poder sentar, que não me agrada no lugar.
Infelizmente enquanto me lembrar desta sensação, não vou ter grande vontade de lá voltar.

Espero, sinceramente, que o sucesso desta ideia não seja a sua perdição. 

domingo, 2 de novembro de 2014

Portugal não tem Mar

Praia de Santa Cruz, Portugal - 2008
Esta é uma daquelas situações que me lembro de ter ocorrido mas que, talvez pelo impacto que teve, não consigo situar muito bem nem no espaço nem no tempo.

Sei que estávamos nós algures no sul de França, junto ao Mediterrâneo, e que estávamos a falar com um habitante local.
A conversa foi derivando e falávamos sobre o mar, o calmo que ele era nas praias do Mediterrâneo e que a temperatura da água ser agradável.
A dada altura dissemos que em Portugal, tirando o sul, o mar era, de uma forma geral, mais violento e mais frio.
E foi aí que tudo aconteceu. O nosso interlucutor virou-se para nós com um ar entre o incrédulo e o espantado e disse: "Mas Portugal não tem mar"

Fiquei sem pinga de francês para ripostar.
Apanhado completamente de surpresa, apenas me saiu a pergunta "Não tem mar?" Tinham-me acabado de cair 800 Km de costa aos pés.
Ainda titubeante repeti "como não tem mar?"

Então tudo se esclareceu. "Claro que não tem mar. Portugal tem oceano. Mar temos nós, aqui, no Mediterrâneo".

De facto, cada um vê o mundo à luz da sua realidade.
De repente apercebi-me que, apesar de toda a minha vida ter frequentado anualmente a praia, apenas há algum tempo atrás tinha verdadeiramente visto O mar.

Ou então não.


Informação adicional em:
Mar, na Wikipédia
O Mediterrâneo na Wikipédia

terça-feira, 28 de outubro de 2014

A Torre Redonda

Rundetaarn, Copenhaga - 2009
Copenhaga é uma cidade baixa. Como tal, qualquer torre ou campanário mais alto destaca-se facilmente no horizonte. E há vários.
Um destes pontos altos é a Rundetaarn ou Torre Redonda.

A Torre Redonda, edificada entre 1637 e 1642 por ordem de Cristiano IV, faz parte de um complexo de edifícios, composto por uma igreja, uma biblioteca e um observatório astronómico.
O observatório fica situado no cimo da torre e é rodeado por uma varanda larga.

É por ser construída para servir de base ao observatório que esta torre se tornou particularmente original. No seu interior foi construída uma larga rampa em espiral, com 209 m de extensão, e que dá 7,5 voltas sobre si mesma, até atingir o cimo.
A razão desta rampa prende-se com a necessidade que houve, na altura da sua construção, de transportar os equipamentos de observação até ao seu topo.
Actualmente, e para além do acesso ao observatório e à sua varanda, a rampa serve também para uma original prova desportiva: uma corrida de monociclos .

A subida, apesar de inclinada, faz-se sem grandes problemas. Mas se nos distraímos, facilmente chegamos lá acima um pouco mais ofegantes.
Talvez para evitar esse cansaço, ao longo da subida existem algumas portas que dão acesso a salas do edifício adjacente e onde é possível visitar algumas exposições temporárias. A visita é sempre um bom pretexto para se ir fazendo umas pausas pelo caminho,

Subi uma única vez ao cimo da Torre Redonda (e não, não foi de monociclo...). O percurso é fresco e, no cimo, na varanda que rodeia o observatório, temos uma fabulosa vista de 360º sobre a cidade.

E, ao fim de uma tarde de verão, com uma leve brisa morna, acreditem, é muito agradável.


Informação adicional em:
A Rundetaarn
A Rundetaarn na Wikipédia

A corrida de monociclos (site oficial)
A corrida de monociclos na Wikipédia


domingo, 12 de outubro de 2014

Fragas de Panóias

Santuário de Panoias, Vila Real, Portugal - 1982
1982.
Nesse ano as férias só poderiam correr bem. Tínhamos uma boa tenda, tínhamos um carro (o Fiat 600 que se vê na fotografia, ao fundo, junto às casas) e eu tinha as minhas primeiras férias pagas (começara a trabalhar). Como tal, só nos restava seguir à aventura pelo país fora.

O Norte sempre fora, para mim, uma zona desconhecida. Trás-os-Montes então era um longínquo lugar, quase mítico. E como não tinham ainda começado a chegar os subsídios da CEE, viajar pelas estradas portuguesas era já por si uma aventura.

Foi com o espírito da descoberta que chegamos a Vila Real de Trás-os Montes.
Uma vez acampados no Parque Municipal (que a memória me diz ser um parque simpático), só nos restava mesmo explorar o que a região tinha para nos surpreender. E a verdade é que tinha.

Confesso que até essa data nunca tinha ouvido falar de Panóias, No entanto, ao fim de algumas voltas chegamos lá, ao "Santuário de Panóias". Um penedio junto a uma aldeia que, para nós, estava longe de tudo.

Para quem lá chega é uma visão estranha. No meio das fragas, abrem-se na rocha uns degraus que nos conduzem a uns buracos rectangulares, com o aspecto de sepulturas.
Depois apercebemo-nos da existência de regos, também eles escavados na pedra.
É um lugar sagrado, de sacrifício.

Ainda na rocha existem inscrições romanas, inscrições essas que, de alguma forma, nos situam o santuário no tempo. Algo que para mim me pareceu anacrónico.
Dos romanos temos a ideia das construções clássicas, de blocos de pedra e colunas. Ali não, tudo tem um aspecto mais "troglodítico".
Para além das pedras esculpidas e da calma que as rodeava, nada mais havia para ver. Mas chegava. Valeu bem a viagem,

Nunca mais lá voltei (nem a Vila Real) mas este lugar fez-me tomar consciência de que no nosso país existem lugares muito estranhos e curiosos. Razão pela qual nunca mais o esquecerei.


Informação adicional em:
Santuário de Panóias (Wikipédia)
Guia da Cidade (Panóias)
SIPA - Sistema de Informação para o Património Arquitectónico
DGCP
Museu de Vila Real

domingo, 5 de outubro de 2014

Memória

Torre de Londres, Londres - 2014
Sempre fui muito critico com as chamadas “instalações".
Das muitas que já tive oportunidade de ver ao longo dos anos, poucas foram aquelas de que eu tenha gostado, reconhecido o sentido, ou impressionado.
Na minha perspectiva não é só o facto de se descontextualizar um objecto, reestruturar um conjunto de objectos, ou recriar um espaço, que me faz considerar só por si, que isso seja arte ou, no minimo, uma provocação. No entanto há honrosas excepções que me fazem considerar e dar credibilidade ao género,

Neste ano de 2014 assinalam-se os 100 anos do início daquela a que se viria a chamar "A Grande Guerra".
Infelizmente todos nós conhecemos o horror que a mesma foi, bem como as consequências que ela teve.

Para lembrar a efeméride, um pouco por toda a parte, nomeadamente na Europa, organizaram-se diversos eventos e cerimónias solenes.
De todos estes acontecimentos nenhum me marcou especialmente. Apenas ficou no fundo da minha memõria que a guerra tinha começado, fazia agora cem anos.

Mas a arte tem destas coisas. No momento em que menos esperava, a lembrança desta guerra e das vitmas que ela causou, cairam-me em cima, da forma mais estranha que eu poderia imaginar.
Neste verão, ao chegar junto da Torre de Londres fui surpreendido com um espectacular memorial aos soldados mortos na Grande Guerra.
Uma instalação, da autoria de  Paul Cummins, cercou a Torre de Londres com 888.246 papoilas vermelhas, em cerâmica. Uma por cada soldado britânico morto durante a guerra.

O contraste entre o imenso campo florido e a estrutura militar (também ela de má memória) onde as flores foram “plantadas”, tornava o conjunto um misto de dramático, estranho e ao mesmo tempo fascinante.

Mesmo que se desconheça a intenção ou o significado da obra, a visão desta mancha vermelha que “escorre” das muralhas é arrebatadora, sendo impossível ficar-lhe indiferente.
Para o provar bastava o facto da multidão de visitantes que, como eu, olhava o fosso florido, se ter mantido num silêncio ou num sussurro quase religioso, enquanto contemplava a obra.

É face a obras como esta que me reconcilio com as ditas "instalações".

Ah! Apenas como curiosidade: a esta instalação o autor deu o nome de "Blood Swept Lands and Seas of Red" (o sangue cobriu as terras e os mares de vermelho). Mas ter este ou outro nome não altera em nada o impacto da sua visão.


Informação adicional em:
WW1 UK Events
poppies.hrp.org.uk
A Primeira Guerra Mundial - Wikipedia

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Aliens

Bairro dos pescadores, Aberdeen - 1987
Em 1987, nós e uns amigos nossos, fomos de férias para a Grã-Bretanha.
Acampados em Edimburgo, decidimos ir conhecer um pouco mais da Escócia, tendo-nos o comboio levado até Aberdeen.

A viagem foi de um dia. Saimos de manhã e regressamos a Edimburgo no final da tarde. Talvez por essa razão, as recordações que tenho de Aberdeen sejam um pouco difusas e inconsistentes.

Lembro-me de como me impressionou o porto, cheio de guindastes, de navios de carga e enormes navios de pesca (que contrastavam com a ideia que eu tinha, de que a pesca era feita por traineiras como as de Peniche, que povoaram a minha infância) e lembro-me do pequeno bairro de pescadores, junto ao mar e longe do centro, onde, na fachada de algumas das pequenas casas, estavam expostas miniaturas de embarcações.

Mas lembro-me, sobretudo, de uma das mais estranhas sensações que já tive em toda a minha vida: a de ser um estranho ou um alien, como diriam os ingleses (neste caso os escoceses)..

Chegados relativamente cedo a Aberdeen fomos percorrendo a cidade. Com o avançar da manhã a fome começou a insinuar-se, pelo que procuramos um lugar para almoçar. Consultadas as diversa listas e preços dos pubs por onde passamos, decidimo-nos por um que se enquadrava nas nossas expectativas.
Situava-se num edifício que teria sido um armazém. Tinha uma porta dupla, opaca, e apenas denunciava ser um pub, pelo facto de ter junto à porta de entrada um placard com a ementa e os respectivos preços.

Empurramos as portas e entramos. O interior era escuro, contrastando com o sol que brilhava no exterior.
Lá dentro, como é normal, um balcão corrido separava o empregado dos clientes. A diferença estava mesmo aí, nos clientes. Todos pareciam ter saído de um filme de motards ou rockers. Vestiam-se maioritariamente de cabedal negro, com aplicações metálicas e botas também elas escuras.

Ao entramos fez-se um estranho silêncio (ou terá sido apenas imaginação minha?). Todos pararam e olharam para os dois casais estranhos, vestindo camisolas claras, jeans e ténis, que acabavam de entrar. O contraste não podia ser maior.
Olhámos, olhámos à volta e, sem uma palavra, demos meia volta e regressámos à rua.

Acabámos a almoçar num pub igual a muitos outros e que não nos deixou memória.

Ainda hoje não sei se não perdemos uma boa oportunidade de conhecer um pub diferente, com clientes originais. Ninguém nos fez mal (nem julgo o que fizessem) mas nós não éramos dali.

domingo, 14 de setembro de 2014

A rosa e o vinho

Região do Loire, França - 2002
Da primeiras vezes que fomos de carro de férias para França, várias realidades me fascinaram.
O cuidado extremo na apresentação e limpeza dos espaços, quer públicos, quer privados, foi uma delas.

As povoações estavam todas floridas (umas mais, outras menos) ao ponto destas terem uma classificação do grau de "florimento" (quais estrelas Michelin), que ostentavam na placa toponímica da entrada.
As estradas estavam todas bem marcadas, arranjadas e sinalizadas, e as bermas quase irepreensivelmente limpas. Tudo o que era campo de cultivo estava bem arranjado e ordenado, tendo até os bosques um aspecto muito "certinho".

No meio deste cenário achei quase ser um exagero de ornamentação haver roseiras plantadas no topo das correntezas das vinhas. De qualquer forma achei ser um habito engraçado, uma vez que quase não encontrei vinha nenhuma que não tivesse a sua roseira no topo das filas de videiras.

Os anos foram passando e este "fenómeno" tornou-se, aos meus olhos, uma caracteristica natural do que eu poderia chamar de uma vinha francesa.
No entanto este fenómeno é tudo menos decorativo. Há coisa de uns anos soube a sua verdadeira razão: as roseiras servem de alarme.

Confuso? Também eu fiquei, mas as razões são simples..

Na segunda metade do século XIX as vinhas europeias foram atacadas por uma praga terrível que quase acabou com elas: a filoxera. Para quem não sabe (como eu não sabia), a filoxera é um insecto, oriundo da América, que ataca a vinha pela raiz, fazendo-a murchar até à morte.

Quem ler os jornais da época (ou mesmo posteriores) pode perceber o quão terrível foi esta praga. Provocou a falência de muitos agricultores e contribuiu para a emigração de boa parte deles, nomeadamente de italianos, para a América.

Quando finalmente se percebeu o fenómeno desta praga, percebeu-se também que a filoxera atacava outras plantas, sendo uma delas a roseira. E a razão é simples (e também fascinante para mim, quando o soube): a videira e a rosa são da mesma família.
A "vantagem" da rosa é que é mais fraca, dando rapidamente sinal da presença da filoxera, permitindo assim as pulverizações da vinha, a tempo da sua salvação.

Se para os agricultores a presença das rosas é uma precaução, para o viajante que passa é um bonito e agradável elemento da paisagem. Com a vantagem de, mesmo sem ele saber, lhe poder permitir saborear um bom vinho no final da jornada.



Informação adicional em:

sábado, 6 de setembro de 2014

A atracção do abismo

Abime de Bramabiau, França - 2003
Estávamos nós acampados em Millau quando nos sentimos atraídos pelo abismo (como irão perceber mais à frente esta é uma piada fácil e má). O tempo estava quente mas, para a visita que íamos efectuar, decidimos levar uns casacos quentes (o guia também o aconselhava).

O abismo que nos atraiu é mais ou menos no meio do nada.
Assim, a estrada leva-nos a um planalto junto de um desfiladeiro, local onde deixamos o carro. A partir dali o caminho é feito pé. Um estradão de terra batida faz-nos descer até ao vale, ao fundo do desfiladeiro.

No fim do caminho descobrimos um pequeno lago que alimenta um ribeiro. É a nascente do Bonheur.
Do outro lado do lago, num penhasco que chega a atingir 120 m de altura, abre-se uma fenda na rocha. Dessa fenda brota, em cascata, a água que alimenta o lago e, consequentemente, o rio. É o abismo de Bramabiau.

É neste local que nos juntamos ao guia e aos companheiros desta "aventura". Uma vez reunido todo o grupo, o guia faz uma pequena apresentação do fenómeno, bem como do que nos espera. De seguida indica-nos um pequeno caminho ou trilho que segue a par do regato e nos leva para o interior do monte.

A partir daqui, qualquer descrição que eu faça não faz jus ao que nos espera.
A fenda que vemos junto ao lago prolonga-se pelo interior do monte e nós seguimos por ela, "pendurados" na rocha, ao longo do rio subterrâneo.

Durante perto de uma hora damos a volta a parte da gruta. A temperatura é baixa, a luz (artificial) é suave e o cenário digno de Júlio Verne. Estalactites, fendas na rocha, marcas da passagem da água acima das nossa cabeças e cascatas fabulosas vão-nos surpreendendo ao longo do percurso.
No fim, a luz do sol volta a brilhar, rasgando a escuridão, e indica-nos que voltámos ao ponto de partida.
Andamos perto de 1 km e o calor do vale faz-nos sentir confortáveis. Apenas lamentarmos o fim da viagem.

Mas esta nascente de água tem outra curiosidade. A origem da água.
O rio que aqui nasce tem origem noutro rio. A cerca de 2 km de distância as águas do Trévezel mergulham na terra, atravessam um emaranhado de grutas naturais, aparecendo novamente à luz do dia no abismo de Bramabiau.


Informação adicional em:
Página oficial
Turismo de Avignon
O abismo na Wikipédia
Grutas em França

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Portugal pequenito

Portugal dos Pequenitos, Coimbra - anos 60
O titulo deste post poderia levar a pensar de que iria falar sobre a pequenez do país em que vivemos (em dimensão, entendamo-nos).Mas não. A razão destas linhas prende-se com aquele que foi (e em certa medida ainda é) o grande "parque temático" português: o Portugal dos Pequenitos.

Em miúdo lembro-me de lá ir pelo menos umas duas vezes. Curiosamente, para além do que ficou registado nas fotografias de então, pouco mais me ficou na memória. Honrosas excepções para o portão de entrada e uma aranha caranguejeira existente num dos pavilhões do "mundo português".

Voltei lá uns bons anos mais tarde, com a minha filha ainda pequena (ou será que deveria dizer pequenita?).
Na viagem para norte, para Santiago de Compostela, parar em Coimbra serviu para descansar e comer qualquer coisa. E, porque não, (re)visitar Portugal, em pequenito?

Constatei que já não me lembrava de muitas coisas, embora outras fossem rapidamente recordadas. No entanto a dimensão do parque encolheu drasticamente face às minhas recordações. Na minha infância o parque seria enorme e as construções, embora pequenas, suficientemente grandes. Agora sentia-me um pouco mais na pele de Gulliver.

No compto final fiquei satisfeito com a visita ao parque. Entre outras coisas, foi agradável constatar que estava conservado, embora parado no tempo, mantendo o aspecto característico dos anos 50/60, com uma ideia de país que talvez já não exista mas que é agradável relembrar.

Quanto à minha filha, desconheço se manteve a tradição familiar de esquecer basicamente tudo o que viu, ou se lhe ficou alguma coisa na memória.
É certo que teve uma vantagem sobre mim para que a recordação não se desvaneça tão depressa. Na saída de uma das casas pequenas em que entrara, ao passar a porta, magoou-se nas costas. Nada que a promessa de um gelado não lhe fizesse parar o choro.


Informação adicional em:

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Circular em França

França - 2007
Saímos de uma curva e, na nossa frente, à beira da estrada, estava um único poste de sinalização com dois sinais. Um de "perigo: lomba" e outro de "proibido circular a mais de 30 Km/h". Circulávamos por uma estrada local e estávamos a entrar numa povoação, pelo que, garantidamente, não íamos a mais de 50 km/h.
Foi nessa altura que vimos, junto do já referido poste, uma deformação na estrada.
Uma onda de alcatrão avançou para nós, lembrando o mar da nossa costa. A Manela (mas poderia ter sido eu) travou o mais a fundo e o mais rápido que pode.

Primeiro sentimos o embate nas rodas da frente (ficando com a sensação de que estas tinham ficado encaixadas nos respectivos guarda-lamas), depois "visualizamos" a sua passagem por debaixo do carro, dando-nos a sensação de planar, e por fim aterramos no alcatrão, do outro lado da onda, deixando o motor ir abaixo.
Penso que durante ainda alguns momentos a Manela continuou a pisar o pedal do travão (eu pelo menos continuei e não o tinha).
Só quando recuperámos do susto é que compreendemos o significado da placa que tínhamos acabado de ver alguns metros mais atrás e que dizia "ralentisseur".

Esta situação ocorreu no inicio dos anos 90 e, para bem do nosso ego, não foi presenciada por ninguém. Também não é por este episódio que não deixo de gostar de conduzir em França. Depois deste, muitos ralentisseurs passaram por baixo do nosso carro (sempre a menos de 30).
No entanto esta história serve muito bem para ilustrar a importância que as autoridades francesas dão ao cumprimento das regras de circulação nas estradas e à segurança nas povoações, socorrendo-se sobretudo de meios passivos de controlo.

Rotundas a sério (passámos por uma que tinha no meio uma vinha) e não obstáculos na via (onde quase não é necessário torcer o volante), a elevação do piso nos cruzamentos (criando um degrau antes do cruzamento e outro à saída do mesmo), pequenos "postes" nas saídas das autoestradas separando a faixa de saída da autoestrada própriamente dita (evitando que os "espertos" entrem na via de acesso em cima da saída ou que os distraídos regressem à autoestrada), ou floreiras nos passeios (para que os peões apenas atravessem nas passadeiras), são alguns dos meios que me recordo de ter visto utilizados para aumentar a segurança nas estradas. E, claro, os ralentisseurs.

Porém, nem todas estas "maravilhas" impedem que a França tenha uma grande sinistralidade (que felizmente tem vindo a abrandar), nem a sensação de desconforto que dá o passarmos ao lado de silhuetas negras, colocados na berma da estrada, nos lugares onde terão ocorrido atropelamentos ou mortes em acidentes.

Tanto quanto julgo saber, a sinistralidade em França sempre foi um problema grave e complexo. Um país fabricante de automóveis e em que o número de viaturas a circular é grande, terá, na minha opinião, muitos problemas para resolver.
No entanto, seja pelos meios passivos de controlo implementados, seja pelo controlo policial que é visível, ou seja porque tive sempre muita sorte, é um facto que a grande maioria dos condutores com que me cruzei cumpre as regras do código. Nas autoestradas o simples facto de ligar o "pisca" para indicar que quero mudar de faixa para ultrapassar um veiculo mais lento, faz com que o veiculo que já segue nessa faixa abrande para eu "entrar" (das primeiras vezes quase fui insultado por não "entrar" logo). Claro que devo (tenho de) regressar à faixa da direita assim que puder, o mais rápido possível.

Quanto a nós, como turistas, tentamos cumprir à risca o código de estrada (uma multa apenas serve para estragar as férias), ao contrário do que por vezes fazemos no nosso dia a dia, onde acontece facilitarmos um pouco. Apesar dessa preocupação, a condução em França é, para mim, muito agradável.
As estradas estão bem conservadas, as direcções estão bem indicadas (baseadas num código de cores que nos permite rapidamente identificar destino pretendido), e os condutores são, de uma forma geral, cordatos (ou talvez só apanhe turistas como eu). Resumindo, a viagem é calma, despreocupada e confortável.

Esquecendo as autoestradas, caras mas com boas áreas de serviço, que apenas nos servem para fazer rapidamente quilómetros, as estradas nacionais e regionais são extremamente agradáveis de percorrer.
Bem marcadas, bem sinalizadas, onde facilmente se encontra uma agradável área de paragem (por vezes aproveitando antigas curvas que foram "cortadas" pelo redesenho da estrada), permitem-nos uma condução descontraída e dar alguma atenção à paisagem envolvente, nomeadamente agora que já sabemos identificar um ralentisseur à distância, atravessando-o suavemente.

domingo, 10 de agosto de 2014

Bancos de Memória


Bancos de Memória em nome de Betty e Malcolm Rowe, que dali viam diariamente o pôr do sol
Bamburgh, agosto 2006
Antes de pisar solo inglês nunca tinha visto nenhum. Nem nunca ninguém me tinha falado neles. Tive uma disciplina anual inteiramente dedicada à cultura inglesa mas não ouvi qualquer referência aos bancos de memória. E, no entanto, são talvez a mais comovente manifestação de amor que alguma vez vi.
Não são obras de arte, não são feitos de materiais únicos e nobilíssimos, não gritam tristeza, desespero, choro, lamentação. São simples bancos. Bancos de madeira, de uma singular simplicidade. Podem estar num jardim, numa rua, numa alameda, num lugar especial de onde se vê o pôr do sol, ou um rio, ou simplesmente quem passa. Chamam-se Bancos de Memória.
Convidam-nos a sentar e dizem-nos ao ouvido o nome de alguém para quem aquele lugar foi especial.
E por momentos esse alguém senta-se ao nosso lado e vê o pôr do sol mais uma vez, ou olha com os nossos olhos a gente que passa.
Não sabemos quem era, mas sabemos que alguém o amou o suficiente para fazer perdurar o seu nome numa placa de um banco oferecido ao descanso do viajante que passa, para que dali veja o que esse alguém outrora viu.

Não há ali lágrimas nem desespero. Há apenas amor.




quarta-feira, 6 de agosto de 2014

It’s raining again...

Heidelberg, agosto 2007
É espantoso como neste blog ainda nenhum de nós falou daquilo que é a praga temida das viagens e dos viajantes: a chuva.
Durante anos as nossas “idas a férias” significavam literalmente “idas a banhos”, não de mar, mas de chuva. Os amigos chegaram a ser prevenidos de que viajar conosco podia significar chuva ou mau tempo, ou os dois, se pudesse ser.
Chegámos a ser avisados numa estação de observação meteorológica, neste caso em Mont Aigoual, de que descer pela encosta norte significava apanhar uma boa chuvada. Isso não nos impediu de descer por lá e de apanhar uma torrente que nos obrigou (e a mais uns quantos afoitos turistas...) a parar até a chuva abrandar um pouco.
A primeira vez que fomos para Londres apanhamos bastante chuva – como seria de esperar - mas nada que nos impedisse de andar pelas ruas e gozar as férias. Acabámos por tomar como hino desse ano um dos êxitos dos Supertramp, que um grupo de jovens cantava na rua alegremente numa noite de chuva.
Depois seguiram-se muitos outros momentos gloriosamente chuvosos: a entrada em Rennes; a chegada ao campismo de Tarbes; a primeira vez que chegamos a Rocamadour depois de uma “orage”; a última vez que entrámos em Inverness (em contramão e em plena feira pecuária); as muitas idas a Santiago, onde “a chuva é uma arte”; a estadia em Salzburgo, em Heidelberg, em Odense, a ida a Carnac... sei lá. Isto só para nomear alguns. Férias sem chuva não eram férias.
Mas bem vistas as coisas, o facto é que a chuva dá a todas as paisagens uma tonalidade menos turística, como se os lugares se mostrassem com a roupa de todos os dias, sem enfeites nem artifícios.
E tem permitido momentos fotográficos inusitados: afinal para nós é que a chuva é uma “chatice”, que aparece para arruinar aqueles poucos dias em que queremos viver num mundo perfeito. Mas para quem vive o dia a dia, a chuva é apenas o inconveniente que apressa o passo mas não impede a ida às compras.
Por isso o melhor é continuarmos a cantarolar os Supertramp, mesmo que a letra não nos pareça a mais adequada:

                 It's raining again
                 Oh no, my love's at an end.
                 Oh no, it's raining again
                 Too bad I'm losing a friend.

                 C'mon you little fighter
                 No need to get up tighter
                 C'mon you little fighter
                 And get back up again
                 Oh get back up again
                 Fill your heart again...





sábado, 2 de agosto de 2014

Bichos

Área de Serviço, algures em Portugal - 2007
Quem já fez alguma viagem, seja ela pequena ou grande, de certeza que já notou a presença de "bicharada" por tudo o que é sitio. Nomeadamente quando esta presença sai fora daquela a que estamos habituados.

Mesmo que numa primeira fase a sua presença não seja detectável (como normalmente acontece quando a viagem é feita de transporte publico), o que é facto é que eles estão algures por lá.
A sua presença tem tendência para ficar bem mais visível quando a mesma viagem é feita de carro. Nomeadamente na matricula e no pára-brisas, e especialmente quando essa viajem é feita de noite
É certo que, normalmente nestes casos, esta presença expressa-se sobre a forma de 'esborrachado'. No entanto dá para ver a fabulosa quantidade e variedade de insectos que vagueiam pelo ar, sobretudo no Verão.

Quando o nosso destino é um país do centro da Europa e a viagem é feita de carro, atravessamos Espanha de noite. Esta opção nocturna tem algumas vantagens. Como as nossas férias são essencialmente no verão (profissões oblige), a temperatura do ar, à noite, é mais amena. Para além disso há menos trânsito e até mesmo a travessia de grandes cidades, como Madrid, é feita de forma mais despreocupada.
Já nas desvantagens aparece a necessidade de ter de fazer mais paragens, quer para troca de condutor, quer para descansar um pouco, "esticar" as pernas e "espantar" o sono. Para além de, claro, retirar a bicharada do carro.
É nessas alturas que damos graças pelo facto de existirem, nas áreas de serviço espanholas, baldes de água com detergente e uma escova. São estas as 'ferramentas' que nos permitem a lavagem (raspagem?) dos vidros, capot e faróis, retirando as camadas de diferentes insectos que se suicidaram contra o carro, atraídos pela luz dos faróis.

Outro local onde os insectos adoram a nossa companhia é nos parques de campismo. Para além daqueles com que nos vamos cruzando no dia a dia, encontramos muitos novos e diferentes amiguinhos que andaram a coabitar connosco, no momento de levantar ferros e desmontar a tenda.

No entanto, de todos aqueles com que nos cruzamos, os que verdadeiramente nos incomodam, são aqueles que nos impedem ou condicionam o usufruto do lazer a que aspiramos, no decorrer das nossas férias.
Estão neste patamar, entre outros, as vespas que nos rodearam a mesa do pequeno almoço, em Hospitalet / Rocamadour (apesar de também me permitirem ser o herói da criançada por as afastar dos sumos de laranja) ou as enormes lesmas que pernoitaram nas sandálias da Joana, em Ribadeo.

Curiosamente a sua inexistência também nos pode causar algum constrangimento (obviamente menor do que a sua presença).
Alertaram-me para o "horror" dos mosquitos na Finlândia, razão que nos levou a estudar, durante alguns dias, todos os tipos de repelentes (electrónicos, comprimidos, sprays, etc), e nos fez comprar e transportar cremes repelentes para melgas. Curiosamente (e felizmente) não vislumbramos qualquer exemplar. Segundo me disseram mais tarde já teria passado a sua época. No entanto, e apesar de nos ter aumentado o conhecimento sobre a matéria, fizeram-nos ficar preocupados.

Mas, de todas as vezes com que nos cruzamos com insectos, no top está a experiência vivida na Dinamarca.
O tempo que apanhámos foi ameno, embora por vezes cinzento e até chuvoso. Só que, sempre que o sol brilhava após uma chuvada, a temperatura subia e, como consequência, nas zonas mais rurais surgiam nuvens de insectos voadores. Principalmente "joaninhas". De tal forma que o carro chegou quase a mudar de cor (autêntico) e andar na rua tornava-se penoso.

Felizmente, todos estes factos não passaram de pequenos episódios ou contratempos, qual nota de rodapé, na história das nossa férias, não ofuscando os óptimos momentos que as férias nos têm proporcionado.

(Nota: este texto está livre de bugs, pelo menos a acreditar no corrector ortográfico)

domingo, 20 de julho de 2014

O saber do vinho

Recepção das caves da Murganheira, Varosa, Lamego - 2012
Se há coisas agradáveis numas férias (para além de descansar, claro) é ter a oportunidade de aprender algo de novo sobre a realidade que nos rodeia.
Por essa razão, sempre que posso, desloco-me para onde possa visitar monumentos, igrejas, museus ou qualquer outro lugar de interesse.

É nesta última categoria que classifico as adegas ou caves de vinho. São lugares interessantes, onde normalmente se junta o útil ao agradável, ou seja, aprende-se algo sobre o vinho enquanto se degusta o objecto da nossa aprendisagem. E por vezes somos ainda brindados com mais alguma sabedoria extra.

Nas minhas passagens pela região de Lamego, sempre que se proporciona, não deixo de visitar as caves de espumante que por ali existem, mais particularmente as caves da Murganheira.

Das primeiras vezes que as visitei assisti ao processo artesanal da produção e aprendi algumas curiosidades sobre a feitura do espumante.
Anos mais tarde voltei lá. Agora, associada a uma multinacional, a produção aumentou pelo que é visível uma maior automatização dos processos.
No entanto, a visita continua a ser um momento agradável (onde, claro, se incluem as já referidas provas).

Momento interessante na visita é a explicação do método de abertura da garrafa, rolhada com uma cápsula, e o retirar do último depósito gerado no processo de fermentação.
Originalmente feito de forma manual, com recurso a um "abre cápsulas" e à mestria de quem o maneja ("espectáculo" a que ainda tive o prazer de assistir nas minhas primeiras visitas), é agora feito de forma mais automática, recorrendo à congelação do gargalo.

Estando a linha de produção parada, a guia explicou o processo, a razão do mesmo e a consequência do reatestar da garrafa, "transformando" o seu conteúdo em espumante bruto, meio seco ou doce.

Não sei se foi por ignorância pura, se para impressionar a sua companhia ou se por já ter feito várias provas, um dos meus "colegas" de visita destacou-se e perguntou, em tom de afirmação: "Mas também há quem faça essa operação utilizando uma espada, não é?".

Num flash veio-me à cabeça a imagem de um operário de espada na mão, a cortar os gargalos das garrafas.
Este meu pensamento foi interrompido pela voz incrédula e titubeante da guia, temendo ter percebido mal a questão: "Com uma espada? Mas isso danificava a garrafa, impedindo-a de ser novamente rolhada".
De facto, bastaria ter pensado um pouco sobre o processo para concluir que a pergunta era despropositada, raiando mesmo o risível.

Curiosamente o autor da pergunta ouviu a resposta sem qualquer vislumbre de arrependimento na sua falta de raciocínio. Enfim, nada que mais um pouco de espumante não fizesse esquecer.
E se é verdade que confessar ignorância ou desconhecimento não envergonha ninguém, também é verdade que exibir essa mesma ignorância não abona nada a quem o faz.

E com este meu ultimo "pensamento" arrumo quem possa pensar que eu apenas visito uma adega para a degustação dos vinhos. Este pequeno episódio prova-nos que, juntamente com uma flute de espumante, podemos sempre aprender mais alguma coisa sobre a natureza humana.



Informação adicional em:
Caves da Murganheira (passe a publicidade)

domingo, 13 de julho de 2014

Realidade aumentada

A Tower Bridge e o City Hall vistos do Monumento, Londres - 2010
The Monument.
Também eu subi os muitos degraus que nos levam até uma vista panorâmica verdadeiramente extraordinária sobre Londres. Mas não me lembro de ter ficado sem respiração e de considerar que nunca mais lá subiria. Enfim, na minha infância, de acordo com as modernas considerações e a opinião da minha mãe, eu devia ser hiperativa, o que me facilita muito a vida no que respeita a escadas de caracol. Claro que as 3 libras que nos pedem para trepar uma escadinha de caracol, onde não há espaço para nos cruzarmos com um alfinete, podem ser um impedimento, mas tenho de considerar que uma hora de exercício aeróbico num ginásio qualquer sai mais cara e não tem a recompensa da vista.
A vista é simplesmente única - 360 graus de telhados londrinos numa mistura de vidro da City, onde o "Gherkin" impera, de guindastes, gruas, e prédios anónimos, com o Tamisa a servir de pano de fundo ao City Hall e à imagem de postal da Tower Bridge. De St.Paul's a Westminster e à London Eye, Londres torna-se uma paisagem de filme.

O incêndio de Londres foi, aparentemente, a maior desgraça da cidade. Mas, de acordo com alguns autores, pode também ter contribuído para a salvação da mesma.
Quando o fogo deflagrou, a cidade tinha sido consumida pela peste durante um ano levando a que uma parte importante da população a tivesse abandonado e outra parte importante tivesse morrido. Por um lado, um número substancial de pessoas foi poupado ao fogo;  por outro, talvez o fogo tenha destruído as causas da peste e dado origem a uma cidade mais limpa e ordenada. No entanto, nunca se chegou a uma conclusão quanto ao número de mortos que o fogo terá feito. Oficialmente poucos; na realidade, possívelmente, muitos.

Mas se o Terramoto de Lisboa, uma catástrofe igualmente avassaladora, eliminou as velhas estruturas medievais e obrigou ao nascimento de uma cidade nova, parece que o Grande Fogo não teve para Londres o mesmo efeito. A cidade nova esperaria ainda 300 anos semeados de epidemias de cólera, de blitz e de smog,  para então surgir em corpos de vidro e aço apontando para o céu.

O Monumento continua lá com os seus 311 degraus mas cá por mim irei subir a um 68º andar para ver uma vista ainda mais ampla: a realidade aumentada espera por mim no The Shard.

Mas, desta vez, de elevador.


The Monument to the Great Fire of London
The Shard
The View from the Shard - the sights and sounds of London


sábado, 5 de julho de 2014

O Monumento

"The Monument", Londres - 2010


A 2 de Setembro de 1666 a padaria de Tomas Farriner, em Pudding Line, incendeia-se.
O fogo é extinto apenas a 5 de Setembro, tendo consumido 44 edificios públicos, 87 igrejas, a catedral de St. Paul e aproximadamente 13.200 casas. Mais ou menos 1/3 da cidade de Londres de então.
Foi "O Grande Incêndio".

Para relembrar o facto, entre 1671 e 1677, foi construída uma coluna de pedra, no estilo dórico romano, com 62 m de altura (202 pés) e que se situa a 62 m (202 pés) do local onde se iniciou o incêndio. A esta coluna foi chamado o "Monumento do Grande Incêndio de Londres" ou "O Monumento", para os íntimos.

O Monumento, que domina toda a zona envolvente, tem no seu interior uma estreita escada em caracol, com 311 degraus (dizem, porque não os contei), que permite o acesso à parte superior da coluna.
Uma vez subida a escada, caso não se tenha desfalecido e após recuperar a normal respiração, temos acesso a uma estreita varanda com uma vista espectacular sobre a cidade.

Estive lá num domingo de Agosto de 2010 e paguei 3 libras para subir os degraus até lá acima. De facto a vista é belíssima, arriscando-se mesmo a ser única, uma vez que não sei se e quando lá voltarei. Com a idade o fôlego tende a diminuir.

Mas vale a pena a subida. Mais não seja porque no fim, quando regressamos ao "chão", dão-nos um diploma em como subimos lá acima, e sobrevivemos.



Informação adicional em:
The Monument
Monumento to the Great Fire of London (wikipedia)