domingo, 26 de julho de 2015

221 B

Baker Street, Londres - 2014
Baker Street. Em 1985, no primeiro ano que fomos a Londres, esta teria de ser uma das paragens obrigatórias.

A avidez de vermos o mais possível, no pouco tempo que tínhamos, obrigou-nos a fazer escolhas. Alguns museus ficaram de fora e noutros apenas visitamos uma ou outra sala. O mesmo aconteceu com ruas ou bairros. Se uns ficaram de fora do nosso roteiro, outros houve que apenas vimos de dentro de um autocarro.

Mas Baker Street era um destino obrigatório.
Sir Arthur Conan Doyle tornou-a uma das ruas mais populares de Londres ao situar ali a morada daquele que é, talvez, o mais famoso detective: Sherlock Holmes.

O passe de Londres levou-nos de metro até à estação de Baker Street, fazendo-nos sair directamente na rua do mesmo nome.
A rua, com passeios folgados e prédios de três andares, tinha bastante transito. De cabeça no ar, fomos seguindo a sequência dos números das portas até finalmente chegarmos ao tão desejado 221B.

A desilusão não poderia ser maior. Um prédio de habitação semelhante aos demais e nenhuma referência à celebridade da porta.
A imagem que me vem hoje à ideia, é de eu estar no passeio de uma rua com muito trânsito automóvel, a olhar para uma porta e eventualmente a pensar: "Pronto. É isto."

Felizmente nesse mesmo ano, numa das nossas voltas ao acaso, deparamo-nos, junto a Charing Cross, com o Sherlock Holmes... o Pub. Ali sim, havia uma sala, um pequeno museu, evocativo da personagem.

A recente realização de alguns (bons) filmes (nomeadamente o realizado por Guy Ritchie em 2009) e séries de televisão (entre boas - Sherlock da BBC - e menos boas - Elementary da CBS), reavivou a popularidade e a memória do detective.

Assim, quando no ano passado saímos do metro na estação de Baker Street, para mostrar a célebre morada à nossa filha, nada me preparava para o que nos esperava.
Ao contrário da primeira visita, não foi preciso procurara o número 221B.
Do outro lado da rua, ao longo do passeio formava-se uma longa fila de pessoas, sobretudo jovens, que aguardavam a entrada e visita, paga, da conhecida morada.
Na porta ao lado, no 221, entra-se agora para a loja de souvenirs, onde é possível comprar toda a memorabilia do detective.

Embora esta fosse uma visão próxima do que esperava encontrar na minha primeira visita, reconheço hoje que não sei qual das duas foi a mais desiludente.

Felizmente o Sherlock Holmes, o Pub, continuava igual a si mesmo, permitindo acabar o dia curando as 'mágoas' frente a um pint de boa cerveja.


Informação adicional em:
Sherlock Holmes
Sherlock Holmes na Wikipedia
Sherlock Holmes, o pub

domingo, 12 de julho de 2015

Estradas de água

Eclusa em Carcassone, França - 1996
Na escola, aprendi que os grandes rios eram importantes meios de transporte.
Como exemplo falavam-nos do Danúbio, do Reno ou do Ródano, entre outros. Estes rios eram percorridos por grandes barcos de mercadorias e de cruzeiro, sendo responsáveis por parte da economia e da riqueza dos países que atravessavam.
Em Portugal tínhamos o Tejo, o Douro e o Guadiana, já para não falar do Mondego, relegado para uma segunda categoria. Mas, tirando o transporte do vinho do Porto em barcos típicos, apenas à foz destes rios era dada alguma importância. Isto porque nós tínhamos o mar.

Olhando para Espanha o panorama que eu conhecia era semelhante ao nosso. Também têm o Tejo, o Douro e o Guadiana (chamados de uma forma um pouco diferente, claro), e mais um ou outro rio "grande", mas, importantes para a economia, eram mesmo os portos de mar.

Paralelamente, a minha experiência dizia-me que, no Verão, grande parte dos pequenos rios ou ribeiros secava, ou ficava perto do seco. E em Espanha imperava quase o deserto.

Como dei por adquiridos todos estes factos, não pensei muito mais no assunto.

Por tudo isto, quando pela primeira vez cheguei de carro a França, achei curioso e agradável encontrar frequentemente pequenos rios.
No entanto, ao contrario dos nossos, estes transportavam grandes quantidades de água. Por isso, não me foi estranho ver muitas vezes, ou atracados na margem ou andando de forma dolente, barcos de recreio e pequenas barcaças de transporte de mercadorias.

Com margens bem cuidadas, boa parte deles tinham agradáveis caminhos que acompanhavam o leito do rio. Foi ao ver esses caminhos que se me fez luz.
Eu deveria saber que aquilo não eram própriamente rios. Simenon já mos tinha descrito, de forma bem melancólica, em muitas das aventuras de Maigret. Eram canais.

Esta "descoberta" foi curiosa. Apesar de saber da sua existência, nunca pensei neles como algo com que me pudesse cruzar.
E o "pior" não foi isso. Foi o facto de que a sua presença se tornar normal na paisagem por onde quer que me deslocasse.
À medida que fui conhecendo a França, apercebi-me que existe praticamente uma segunda rede viária, mas de água. Grande parte de França está coberta por uma rede de canais. E essa rede de canais não se fica apenas por França. Entre canais e rios pode-se chegar à Bélgica, à Holanda ou à Alemanha.

Fascinante também foi ver toda a arquitectura e engenharia associada aos canais. Para permitir a ligação entre os diversos cursos de água existem dezenas, senão centenas de eclusas, assim como incontáveis pontes e viadutos.
Para espanto meu existe, pelo menos, um aqueduto de vários arcos que permite a passagem de um dos canais por cima de um vale, sobre uma estrada nacional.

Como referi, é fácil ver com frequência nos canais e pequenos rios, barcaças e barcos de recreio. Já junto ás eclusas a sua quantidade é bem maior.
Apercebi-me então da dimensão e importância que estas "estradas" têm no interior da Europa.

No entanto, à minha dimensão, o que mais me seduz nos canais é poder percorrer boa parte de França, calmamente, atravessando aldeias, bosques e campos de cultivo. Enfim, fazer umas férias bucólicas e rurais, com uma perspectiva completamente diferente de uma região ou país.

E, se apenas por ver os canais esta sedução já existia, ela aumentou substancialmente no dia em que, na 'Autoroute des Deux Mers', após algumas horas de viagem nuns quase constantes 130 Km/h, decidimos parar numa área de serviço, junto a Toulouse, para almoçar.
Descobrimos então que esta área de serviço era utilizada não só pelos utentes da auto estrada como também pelos do canal do Midi. E, acreditem, no final da refeição, achei que seria muito mais agradável embarcar num dos pequenos barcos que ali estavam e seguir viagem calmamente, à sombra das enormes árvores que ladeiam o canal, do que voltar para o carro, mesmo com ar condicionado, para retomar a autoestrada.

No horizonte ficou a esperança de um dia alugar um barco e percorrer languidamente algumas dessas "estradas de água".


Informação adicional em:
Vias navegáveis de França
Projecto Babel - Dicionario dos rios e canais
Carta das eclusas
Lista dos canais - Wikipedia

Aluguer de embarcações