Kyle of Lochalsh, Escócia - 1985 |
Desde miudo que “comboio” é sinónimo de viajar.
Embora andasse prioritariamente de camioneta, para destinos mais longínquos como Lisboa ou Coimbra ia sempre de comboio.
Este foi sempre o meu meio de transporte preferido. Não porque fosse propriamente
mais confortável (com excepção do pequeno trajecto entre Alfarelos e Coimbra B
feitos no “rápido” de Lisboa), mas porque era o mais aventuroso. Podiamos andar
em pé, balançando ao som das rodas nos carris, tinha casa de banho (o que era
sempre bom e onde se podia ver a linha passar por baixo da sanita, visão por
vezes assustadora) e, à noite, no regresso de Coimbra, dormia atravessado no
banco, embalado pelo movimento da carruagem.
Sobre a camioneta o comboio tinha ainda, para mim, outra vantagem: eu não enjoava.
Dessas viagens tenho ainda mais duas recordações: o facto de o meu pai
saber sempre a sequência das estações e apeadeiros por onde passávamos (ou
então enganava muito bem) e a eterna pergunta, quando a viagem já ia longa e
cansativa: “ainda falta muito ?”.
Acima de tudo, desta época, ficou o prazer de andar de comboio, bem como o
sonho e o desejo de fazer grandes viagens.
Sorte do destino quis que a minha companheira de aventuras partilhasse o
mesmo desejo e paixão por comboios. De tal forma que, para poder apreciar o prazer
da viagem de comboio, chegámos a “embarcar” de véspera o carro para o Porto e fazer
a viagem no “foguete”, no dia seguinte. É certo que o carro em questão era um
Fiat 600, com quase vinte anos, e de outra forma, a viagem demoraria uma
eternidade. Mas o que nos agradava nesse pequeno luxo era, sobretudo, a viagem
de comboio.
O comboio tem um problema. Pode ser a última maravilha da técnica ou... a
última maravilha de há muitos anos (e por vezes sabe-se lá em que estado de
conservação). No entanto, a meu ver, as vantagens superam em muito os
inconvenientes. Para além da descontração da viagem, as linhas de comboio
passam quase sempre por fora dos centros urbanos e das povoações, dando-nos uma
visão diferente dos lugares e das paisagens. Mesmo quando entram nas cidades a
visão que nos mostram é única e diferente. Guardo na memória, entre outras
imagens, a vista deslumbrante do Porto, de cima da ponte Dª Maria e, por
oposto, os bairros degradados dos arredores de Paris.
A minha grande traição ao comboio ocorreu na minha primeira viagem de longa
distância. Bem mais económico, foi num autocarro que cheguei pela primeira vez
a Paris, após dois infindáveis dias sentado num banco.
Nesse mesmo ano foi ainda um autocarro que me levou a Londres. No entanto
foi o comboio que me permitiu um primeiro vislumbre da Grã-Bretanha e em
especial da Escócia.
Numa época em que se investe cada vez mais em estadas, é ainda graças ao
comboio que se podem admirar paisagens fascinantes ou chegar a locais longínquos
como o da imagem.
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