domingo, 15 de junho de 2014

Portunhol

Menu em Catalão - Andorra
O liceu deu-me algumas bases de francês e inglês. Tudo o resto (o?) veio da prática, que é como quem diz, das cabeçadas.
Estas duas línguas vão dando para me ir "safando" em boa parte da Europa. No entanto no sul raramente me socorro delas.

É claro que um "bom português" é um falante nato de qualquer língua latina, nomeadamente do espanhol (castelhano) e/ou do italiano. Basta alterar um bocadinho a pronuncia e oh pra nós a falar qualquer das línguas. Pelo menos parece.

No entanto as minhas "habilidades" não me fazem pertencer a esse grupo de portugueses e, para tentar não passar por grandes vergonhas, opto por "cada um falar com a sua" (língua, claro). Tomei como principio, nesses países, falar sempre em português. Em situações mais difíceis acedo a titubear uma ou outra palavra ou expressão que conheço, como forma de demonstrar a minha boa vontade em comunicar.
E em abono da verdade, tem havido boa vontade de ambos os lados e lá me vou safando.
Com alguns percalços, claro.

Esta minha decisão começou logo de principio, quando me comecei a aventurar para além fronteiras. Verdade seja dita que as minhas primeiras incursões nas terras de "nuestros hermanos" começaram pelo lado mais fácil. Isto é, pela Galiza. Enfim, quase em casa.
Nos anos 80 fui várias vezes até ao norte, mais concretamente a Santiago de Compostela. Estávamos na época do nacionalismo crescente, da grande afinidade com  Portugal. Até me fizeram desconto numa loja, só por ser português.

No entanto essa facilidade foi-se desvanecendo, à medida que me fui afastando das nossas fronteiras.
Apesar de não me poder queixar da boa vontade dos meus interlocutores, quando menos esperei, saltaram as diferenças abismais existentes entre as nossas línguas. No entanto, cada novo percalço foi servindo, mais não seja, para enriquecer o meu vocabulário nessa língua. Senão vejamos:

Em 1994 estávamos nós acampados em Somiedo, nas Astúrias, quando verificámos que se tinham acabado os fósforos. Uma breve incursão à Casa Abrigo e eis-me a gesticular e a pedir, no meu melhor português, "fós-fo-ros". Nada! Mais uns gestos e... fez-se luz (de facto é um trocadilho fraco) ao moço que me estava a atender: "cerillas!!". Nem mais.
Sorte ou azar, trazia já eu as cerillas de volta quando descobrimos que era preciso também umas bolachas. Assim que reentrei na Casa Abrigo o moço começou-se a rir da minha expressão. Bolachas? titubeei eu. Não!
Fosse do objecto, fosse por sorte, fosse por já ter ganho alguma prática, mas de facto desta vez foi mais rápido: "galletas". Felizmente quando lá voltei na vez seguinte foi para beber café, palavra mais universal.

Já em Andorra as coisa pioram. Nem castelhano nem francês. Descobri o catalão.
E se do castelhano já tínhamos as fresas em vez de morangos. Aqui temos maduixes.  Já si us plau é "se faz favor".Também descobri, da pior forma diga-se de passagem, que tancat é fechado. Mas, felizmente, a comunidade portuguesa é grande e, de uma forma geral, os andorranos são simpáticos, razões para lá me ir entendendo com o meu português.

Em Itália a "coisa" já não é assim tão simples. Apesar de pensarmos que acaba tudo em 'ini' (o que, por sinal, é um plural) as semelhanças quase não existem. É um facto que o muito cinema italiano que fui vendo na televisão, durante a minha juventude, permitiu-me conhecer algumas expressões mais comuns. No entanto aqui jogar ao "gesto é tudo" é bem mais necessário.
Em 1991 parámos nós numa área de serviço de autoestrada, calhando-me a mim ir comprar água. Duas garrafas pequenas, mais precisamente. Tão fácil como dizer "água! duas (mostrar dois dedos) ga-rra-fas pequenas (mostrando as mãos muito próximas, uma por cima da outra)" e pronto. O funcionário, com um ar de quem tinha percebido tudo, perguntou: "bicchieri?". Ups! Já estou tramado. Possivelmente é a marca, pensei eu mais descontraído. E acenei com a cabeça em sinal de assentimento.

Quando cheguei ao pé da Manela com dois copos de plástico cheios de água, perante um olhar misto de interrogação e espanto, apenas referi "não digas nada|". Acabara de aprender mais uma palavra italiana: copo descartável.

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